Por Thiago Labliuk (*)
Nessa década, as empresas enfrentam um cenário de mudanças inevitáveis e cada vez mais aceleradas. Modelos tradicionais de gestão e operação, que por décadas garantiram eficiência e estabilidade, estão se tornando obsoletos diante de um mundo movido por dados, automação e novas exigências regulatórias.
Uma potente mistura de mudanças guiadas pela tecnologia e demandas em evolução de clientes apresentam para a maior parte das empresas a expectativa de que seus modelos de negócio irão precisar de mudanças fundamentais nos próximos três anos – seja na forma de criar novos produtos ou serviços que substituirão os antigos, seja com transformações radicais que as orientarão para fontes de receita totalmente novas.
A transformação digital deixou de ser um diferencial competitivo para se tornar uma necessidade estratégica. Pressionadas pela velocidade do avanço tecnológico e pela crescente complexidade dos riscos, as empresas precisam reinventar sua abordagem, não apenas para inovar, mas para sobreviver. Segundo uma pesquisa do Gartner, 85% das organizações já adotaram ou planejam adotar um modelo centrado no produto para desenvolver novas aplicações, substituindo abordagens tradicionais baseadas em projetos. Essa transição evidencia a urgência de reavaliar os modelos operacionais, garantindo que sejam ágeis, resilientes e capazes de antecipar ameaças e oportunidades.
Diante desse contexto, um novo paradigma se impõe: simplesmente investir em tecnologia ou atrair talentos não é mais suficiente. Empresas que desejam prosperar precisam ser intencionais em relação ao seu design interno, reduzir o atrito organizacional, construir adaptabilidade para mudar e facilitar a execução de visões e estratégias pioneiras. A governança corporativa, especialmente no que tange à gestão de riscos e compliance, não pode ser reativa; ela precisa estar integrada à estratégia de negócios, funcionando como um motor de inovação e crescimento sustentável.
Com este contexto desafiador, destaco a importância das empresas revisarem seus modelos operacionais, buscando uma maior conexão com sua proposta estratégica e posicionando a Governança de Dados como um ativo fundamental para essa transformação.
Outro ponto importante: Eu não vou escrever sobre Inteligência Artificial! Acredito que essa prática já deve ser parte do status quo de qualquer empresa, como ferramenta essencial, e não há necessidade de mais especialistas repetindo o óbvio. O foco deve ser a geração de resultados.
Modelos Operacionais e sua necessidade de evolução
Um modelo operacional pode ser resumido como a combinação de talento, processos, tecnologia e capacidades personalizadas que ditam como a organização funciona e como as pessoas dentro da organização trabalham juntas. Isso significa que toda organização tem um modelo operacional – seja ele formalizado ou não.
Existem diversos formatos de modelos operacionais, que variam desde os mais tradicionais, focados na busca por eficiência (como os funcionais, os baseados em processos, projetos ou matriciais), até aqueles centrados em inovação e experimentação — que, sem a devida gestão, correm o risco de perder foco e tração —, bem como os que priorizam produtos ou os orientados a plataformas, com maior integração a ecossistemas abertos de fornecedores, parceiros e clientes.
As empresas que permanecem presas a modelos operacionais tradicionais enfrentam um desafio crítico: a desconexão com as dores dos clientes, cujas necessidades evoluem em ciclos cada vez mais curtos. Em um ambiente onde as expectativas mudam rapidamente e novas soluções surgem constantemente, operar com estruturas rígidas significa perder a capacidade de responder com agilidade. Modelos operacionais excessivamente burocráticos ou centrados apenas na eficiência interna dificultam a adaptação, com o eventual estrangulamento do backoffice, pode tornar a experiência do cliente inconsistente e reduzindo a percepção de valor.
Adicionalmente, um efeito colateral esperado com a busca excessiva de eficiência está ligado a perda da capacidade da empresa em investir em novas propostas de produtos e serviços. A pressão constante por retorno no curto prazo faz com que a inovação seja tratada como um risco financeiro, em vez de um motor de crescimento.
A transformação dos modelos operacionais é uma necessidade premente em um contexto de alta competitividade, que exige uma postura mais adaptativa e intencional diante da urgência de inovar. Nesse cenário, incorporar a análise de dados como parte essencial do modelo operacional torna-se um diferencial estratégico, pois permite às empresas não apenas compreender em tempo real as demandas do mercado e os comportamentos dos clientes, mas também antecipar tendências e ajustar processos com agilidade. Assim, os dados deixam de ser apenas um recurso secundário e passam a guiar decisões, conectar diferentes formatos operacionais — dos tradicionais aos orientados a plataformas — e assegurar que a inovação seja direcionada e eficaz.
Em vez de lançar mais um programa de transformação pontual, é hora de estabelecer modelos operacionais que se encaixem no novo ambiente digital e garantam a longevidade e competitividade da empresa no longo prazo, focado na contínua manutenção da boa experiência do cliente e parceiros.
Governança de Dados: De Iniciativa Superficial a Pilar Estratégico
Tradicionalmente, muitas empresas tratavam a governança de dados como uma iniciativa isolada, muitas vezes voltada apenas para atender requisitos regulatórios, resultando em iniciativas isoladas ou tratadas por áreas sem a expertise necessária. No entanto, a crescente complexidade do cenário digital demanda uma abordagem mais robusta e estruturada.
O cenário mudou e os modelos operacionais mais distribuídos, com uma maior maturidade no uso de dados e concentrados em evoluções paralelas da experiência dos usuários em uma plataforma específica, tem ampliado a capacidade das empresas de responder às necessidades dos clientes com agilidade e inovação. Nesses modelos, equipes e unidades ganham autonomia para acessar e utilizar uma abundância de dados, fortalecendo sua flexibilidade operacional. No entanto, essa descentralização só é eficaz e segura quando sustentada por uma governança de dados robusta. Sem ela, a distribuição de acesso pode levar a inconsistências, duplicações ou até mesmo ao uso indevido de informações sensíveis, comprometendo a confiança do cliente e a conformidade regulatória.
Dar mais liberdade aos times não implica delegar decisões sem critério, mas sim capacitá-los a agir com independência, desde que os resultados sejam claros e mensuráveis. Essa abordagem, porém, pode gerar tensões, especialmente para a média gerência, que frequentemente se vê dividida entre equipes buscando inovar e uma liderança ainda apegada a práticas tradicionais. É a capacidade de medir e demonstrar o impacto das decisões com dados que torna esse modelo viável, alinhando a flexibilidade dos times a uma visão estratégica coesa e sustentável.
A governança de dados é essencial por diversos motivos que impactam diretamente o sucesso e a sustentabilidade de uma organização, especialmente em um ambiente digital e competitivo. Seu objetivo é garantir a qualidade e confiabilidade das informações, assegurando que os dados sejam precisos, consistentes e atualizados. Isso é crucial para a tomada de decisões estratégicas, transformando os dados em um ativo estratégico que permite inovação contínua e adaptação às mudanças de mercado. Sem uma governança eficaz, as empresas correm o risco de operar com dados desestruturados, inseguros e pouco aproveitáveis, o que resulta em perda de competitividade em um mundo cada vez mais orientado por dados.
Queremos evitar a situação em que, durante a tomada de decisão, se ouça:
“Esse número está errado! O departamento XPTO me apresentou outro número.”
Também buscamos eliminar a falta de responsabilidade de quem gera insights, que, eventualmente, negligência a avaliação da qualidade dos dados em favor da rapidez em apresentar qualquer resultado.
Hoje existem muitos profissionais que gostam de código (programar em qualquer linguagem, para evitar viés), mas possuem pouco entendimento sobre as necessidades dos negócios. O resultado disso são iniciativas sem impacto real, gerando um desperdício de recursos e frustração da liderança sênior. Para agravar a situação, os agentes inteligentes, da noite para o dia, capacitaram muitos profissionais em programação, mas, pela falta de fundamentos técnicos sólidos, esses profissionais estão gerando resultados insustentáveis, que podem influenciar negativamente as decisões.
Dessa forma, a governança de dados atua como o alicerce que harmoniza a liberdade operacional com a integridade e a segurança das informações, garantindo que a descentralização gere valor em vez de riscos.
Para que a governança de dados desempenhe um papel transformador dentro do novo modelo operacional, algumas diretrizes são fundamentais:
Estratégia e Cultura de Dados – A governança de dados precisa estar alinhada com a estratégia de negócios, garantindo que os dados sejam um ativo valioso na tomada de decisões. Além disso, a cultura organizacional deve promover o uso responsável e inteligente das informações.
Segurança e Privacidade como Default – No ambiente digital, segurança e proteção de dados precisam ser princípios fundamentais desde o design dos processos e produtos. O conceito de “Privacy by Design” deve ser incorporado às práticas diárias das empresas. (+Info: Artigo que escrevi sobre o tema nessa era dos dados)
Controle de Acesso Dinâmico: Garantir o acesso adequado sobre o que é necessário. Evitar eventuais redundâncias de dados e tratamentos inadequados, que fujam das políticas da companhia.
Automação e Qualidade de Dados – A implementação de tecnologias avançadas para monitoramento, classificação e controle de qualidade dos dados é essencial. Machine learning e inteligência artificial podem ajudar na detecção de inconsistências e na garantia da integridade dos dados.
Conformidade Dinâmica – A governança precisa ser ágil para acompanhar mudanças regulatórias e desafios emergentes. Modelos rígidos e excessivamente burocráticos podem comprometer a adaptabilidade necessária para operar em um ambiente de negócios dinâmico.
Medição e Responsabilidade – Definir métricas claras e atribuir responsabilidades específicas dentro da organização são aspectos fundamentais para garantir a eficácia da governança. Indicadores como confiabilidade dos dados, tempo de resposta a incidentes e conformidade com normas devem ser monitorados continuamente.
Conforme destacado acima, dentre as diretrizes fundamentais, a integração fluida da proteção de dados e da segurança ao longo de todo o processo de acesso e manipulação de dados, potencializa a otimização dos modelos operacionais ao transformar a governança em um componente orgânico, em vez de um elemento isolado. Ao incorporar essas preocupações diretamente nos fluxos de trabalho — e não tratá-las como uma camada separada —, as empresas ganham agilidade e reduzem custos relacionados a retrabalho, avaliações intempestivas ou superficiais e penalidades decorrentes de falhas de segurança.
O Futuro é Integrado: Governança de Dados Como Diferencial Competitivo
À medida que empresas reestruturam seus modelos operacionais para se adaptarem ao novo cenário digital, a governança de dados se torna um diferencial competitivo e não apenas um requisito regulatório. Organizações que integram a gestão de dados de forma estruturada e estratégica terão maior capacidade de inovação, resiliência contra riscos e agilidade na resposta a mudanças de mercado.
A nova era dos negócios exige que governança de dados, segurança e privacidade sejam elementos naturais das operações empresariais, enraizados na cultura organizacional e na forma como os processos são estruturados. Aquelas que compreenderem essa necessidade e agirem proativamente não apenas sobreviverão à transformação digital, mas se destacarão como líderes em um mundo onde a informação é o maior ativo.
Por fim, acredito que os líderes de dados devem estar cada vez mais próximos das equipes de produtos, operações, tecnologia e a gestão de riscos. Isso pode garantir maior patrocínio e evitar iniciativas redundantes, que podem entrar em conflito com a necessidade de uma governança estruturada e integrada.
Em um mundo onde os dados são o novo ativo estratégico, a governança de dados não é apenas uma responsabilidade – é um imperativo para o futuro dos negócios.
* Thiago Labliuk tem impulsionado a transformação das áreas que integram o ecossistema de IRM (Integrated Risk Management) no mercado, incluindo abordagens focadas em Prevenção a Fraudes e Prevenção à Lavagem de Dinheiro (PLD). Com uma visão estratégica, tecnológica e orientada a dados, ele apoia as empresas na construção e entrega de um portfólio de soluções capazes de potencializar o formato de trabalho e gerar valor de forma exponencial.
Referência: